Lançamento do livro "Patrimônios alimentarios na América Latina"

Nas últimas décadas, as práticas alimentares na América Latina mudaram significativamente, e novos problemas relacionados à desnutrição de populações vulneráveis ou à qualidade dos alimentos produzidos têm surgido. Neste contexto, estudos acadêmicos, bem como projetos de desenvolvimento realizados por governos e ONGs têm se concentrado na questão da "soberania alimentar", enquanto uma parte importante da sociedade civil tem se mobilizado em nome do direito à alimentação saudável e em prol de uma melhor valorização da diversidade das produções locais. Assim, através da promoção de sistemas alimentares territorializados, da catalogação de práticas "tradicionais" de conservação e processamento de alimentos, ou da exigência de reconhecimento de pratos e receitas locais, a noção de "patrimônio alimentar" tornou-se mais amplamente utilizada, tanto entre os atores públicos quanto entre associações e acadêmicos.

O que está por trás desta expressão? Para responder a esta pergunta, as e os autores deste trabalho coletivo produziram algumas reflexões críticas e evitaram a armadilha de usar o "patrimônio alimentar" como elemento de linguagem romantizada.

Em uma base multidisciplinar, esse trabalho baseia-se em pesquisas realizadas na Argentina, Cuba, Bolívia, Equador, Brasil e México, e pretende ser uma contribuição aos estudos sociais que buscam articular alimentação e desenvolvimento. Assim, esta publicação deve ser vista como um convite a contribuir para o debate através de novas pesquisas sobre o papel da valorização da diversidade das práticas alimentares na abordagem dos desafios socioeconômicos e ambientais.

Os trabalhos da primeira parte abordam a questão do patrimônio alimentar e sua relação com a soberania alimentar. Na América Latina, o crescimento da agroindústria não resolveu o problema da insegurança alimentar de milhões de habitantes, nem nas áreas rurais nem nas urbanas.
Ao mesmo tempo, a perda da agrobiodiversidade é uma ameaça ao conhecimento agrícola e às práticas alimentares locais. Por esta razão, diferentes autores promovem a agroecologia para melhorar a agricultura familiar camponesa e alcançar a segurança alimentar na América Latina. Enquanto isso, outros consideram que uma reconexão rural-urbana deve ser um objetivo prioritário das políticas públicas.

Na segunda parte do livro, destacam as ligações entre o patrimônio alimentar e o desenvolvimento territorial, estudando o processo do patrimônio como alavanca para o desenvolvimento territorial através da organização dos atores locais. Encontraremos aqui os resultados do estudo realizado por Laura Duarte, Stéphane Guéneau, Janaína Deane de Abreu Sá Diniz e Carlos José Sousa Passos, na região do Cerrado, centro-oeste do Brasil. O avanço da fronteira agrícola levou a uma nova dinâmica regional: quase metade da vegetação original foi transformada em terra para criação de gado e agricultura em larga escala, enquanto a biodiversidade do Cerrado é utilizada pelas populações locais para fins medicinais e alimentícios. A conservação do patrimônio oferece uma alternativa ao agronegócio, particularmente com o festival gastronômico da Semana do Cerrado, mas com muitas limitações.